O último Programa de Mediação do projeto Espectadoras(es)- Docentes: tateando espaços de fruição, contou com o espetáculo De Página em Página, do gênero teatral de formas animadas, com a técnica de fantoches, manipulados pelo artista Sid Ditrix, que também assina a dramaturgia da peça. A direção do espetáculo é da artista Ana Acácia e ambos artistas são integrantes da Trupe Perambula.
Todas as ações do Programa de Mediação aconteceram no Arte Ativa Espaço Cultural, de modo concentrado. O encontro antes da apreciação da peça foi realizado das 13h30 às 16h30, a apresentação às 16h30 e a mediação pós a fruição das 17h30 às 20h30.
O Espaço Cultural é uma iniciativa da artista e professora Lu May, localizado no bairro da Fortaleza, que além de promover eventos culturais, também oferta cursos de teatro, contribuindo com a descentralização do acesso ao bens culturais na cidade.
A experiência deste conjunto de ações de mediação com as/os espectadoras(es)-docentes, moveu também a junção de um conjunto de artistas que dedicam-se em fomentar a arte teatral local e que me fez refletir questões estruturantes que compõem o complexo caleidoscópio do campo da mediação teatral.
Vale ressaltar que as ações de mediação foram realizadas em parceira com a TBT -Temporada Blumenauense de Teatro, um movimento existente desde 2005, organizado por grupos, artistas e produtoras/es da cidade de Blumenau, que busca impulsionar a arte teatral local. Porém, a articulação da TBT foi consideravelmente afetada após a pandemia do COVID-19. Apesar de termos estabelecido uma grande rede para a criação de projetos virtuais durante um dos períodos pandêmicos, o movimento não conseguiu manter-se ativo ao longo dos quase dois anos de distanciamento social por conta da pandemia.
A Temporada Blumenauense de Teatro pode representar uma das várias microestruturas fundantes que compõem a macroestrutura do campo da mediação. Neste movimento concentram-se pessoas que mantém espaços físicos destinados as atividades teatrais, pessoas que produzem os espetáculos na cidade; ministram cursos e oficinas; atuam na área da educação; promovem festivais e outros eventos, entre outros. E apesar deste projeto procurar se aprofundar nas possibilidades do universo linguístico/simbólico das espectadoras(es)-docentes, todas as questões que envolvem o acesso físico ao espetáculo são essenciais para a realização de ações dessa natureza.
Assim, sem uma programação teatral contínua, em que as ações sejam ofertadas gratuitamente ou com preços populares, sem a manutenção dos espaços físicos culturais, sem a garantia de que as pessoas tenham condições de deslocar-se até o local, torna-se praticamente inviável a realização de práticas de mediação na esfera simbólica. Em Blumenau, as artistas/produtoras da área do teatro ainda investem grande parte do seu tempo lutando para tentar garantir o acesso físico dos espetáculos ao público e por falta de políticas públicas efetivas, todo este trabalho ainda é ínfimo comparado a uma população de mais de 360.000 habitantes.
Todavia, são redes como a que a TBT movimenta que vão constituindo nossas microrrevoluções diárias no cotidiano blumenauense e que faz reexistir o teatro na cidade. O espaço gerido pela artista Lu May, o espetáculo do artista Sid Ditrix, da Trupe Perambula, são imprescindíveis para que um projeto como este de mediação teatral possa acontecer. E considero de suma importância que as/os docentes da área da educação sejam conscientes e participem deste movimento promovido pelas artistas locais.
Por isso, a aproximação entre a educação e o teatro pode ganhar outros contornos para além da circulação de espetáculos nas escolas e das idas dos estudantes ao teatro. Criar oportunidades de encontros antes e depois das apresentações com a comunidade escolar pode ser uma caminho neste sentido. Encontros estes em que o fazer e o fruir possam ter suas zonas limítrofes borradas e que a atuação das/os espectadoras/es como artistas seja evidenciada. Assim, como artista integrante da TBT, tenho me perguntado:
Como podemos incluir a formação das/os espectadoras/es nas nossas práticas/projetos? Como dilatar nossos processos artísticos contando com uma participação mais afetiva e efetiva das/os receptoras/es? Por que nossas práticas artístico-pedagógicas tendem a priorizar a técnica de artistas propositoras/es?
É justamente nesta direção, a fim de criar possibilidades para que as/os docentes possam ampliar sua relação com a arte teatral, que este projeto de pesquisa se movimentou. Para tanto, nesta etapa as/os docentes puderam conhecer um novo espaço cultural da cidade e habitar este lugar de diferentes maneiras. A oficina prática antes da fruição incluiu dinâmicas de relação com objetos inanimados, como por exemplo uma folha de papel, os percebendo também como extensão do corpo. Além das improvisações individuais em que cada pessoa relacionava-se apenas com a folha de papel, as participantes também puderam improvisar entre si. Nas nossas conversas falamos sobre a atuação das/os bonequeiras/os e as especificidades e alterações do Teatro de Formas Animadas. Neste programa não chegamos a criar cenas, mas isso não é uma regra, contudo, considero essencial alinhar e focar a prática na atuação das participantes como espectadoras/es.
Observa-se que o termo espectador – e não seu e correlato público – está no centro de nossas preocupações; não é, pois, ao conjunto quantitativamente configurado dos fruidores que voltamos nossa atenção, mas sim à subjetividade necessariamente envolvida na relação de cada indivíduo com a obra artística. ( PUPO, 2015, p. 333)
E na busca pelas individualidades, no encontro pós fruição, as professoras/es participaram de um bate-papo, em que o artista pôde responder as inquietações das pessoas da plateia. As perguntas giraram em torno das técnicas de manipulação e da dramaturgia. Após a conversa voltamos a sala e criamos outras dramaturgias coletivas a partir das reverberações do espetáculo. Nossas criações nos levaram a trocar sobre nossas vidas no hoje, no ontem e no amanhã, e assim, lemos algumas páginas de nossas subjetividades, escrevemos outras, rasuramos algumas já escritas e quiçá vislumbramos a possibilidade de algumas páginas em branco.
Referências
Maria Lúcia de Souza Barros Pupo - Luzes sobre o Espectador: artistas e docentes em ação
Rev. Bras. Estud. Presença, Porto Alegre, v. 5, n. 2, p. 330-355, maio/ago. 2015.
D i s p o n í v e l e m : < h t t p : / / w w w . s e e r . u f r g s . b r / p r e s e n c a >
Programação: TBT - Temporada Blumenauense de Teatro
Espetáculo: De Página em Página
Grupo: Trupe Perambula
Sinopse: Enfim, a casa da Oma!!!!! Pipe esperou ansioso por esse dia. Ficou em isolamento e planejou toda sua estadia na casa da tão querida Oma. Mas, chegando lá, apesar do delicioso cheirinho de comida caseira e da saudade que estava, seus planos vão de mal a pior quando descobre que na Oma não tem Wi-Fi. E agora? Será que Pipe conseguirá passar o dia sem dar nenhuma olhadinha na tela do celular? Talvez uma boa bisbilhotada pela casa e uma amizade inesperada, ajudem ele a reparar em outras coisas.
Mais informações sobre o espetáculo clique aqui
Registro Fotográfico: Sabrina Marthendal
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